hoje senti o cheiro das uvas o negrume adoçando os dedos bago a bago o outono deflagra
e eu ouço o canto triste dos plátanos os passos dúbios da chuva como se em algum lugar houvesse pão a cozer e um fogo dentro de casa noite escura pela tarde ainda a meio
e recordo os risos em volta da escola os joelhos esmurrados doridos esse tom de infância que nunca mais terei.
15 de Setembro de 2003
outonal #2
o lamento visível é o corpo que não volta a fazer-se tenro como a promessa de que há-de crescer
e nunca mais agora poderei abraçar um plátano com braços insuficientes nem cair da bicicleta para os silvados de amoras ou sequer aquietar um pássaro nas minhas mãos de criança
se não fui a tempo de rir todos os risos cair em todos os caminhos sonhar todas as histórias talvez agora encontre uma sucessão de passos semelhante à memória das sombras na parede do quarto dos casacos para enfrentar o vento dos inesperados labirinos do medo
aguardo um Outono pacífico um outro silêncio que não este um poço de folhas para pousar o corpo agora desmesurado amedrontado e espectante.