domingo, 10 de junho de 2007

 

 

 

 

outonal #1

hoje
senti o cheiro das uvas
o negrume adoçando os dedos
bago a bago o outono deflagra

e eu ouço
o canto triste dos plátanos
os passos dúbios da chuva
como se em algum lugar
houvesse pão a cozer
e um fogo dentro de casa
noite escura pela tarde ainda a meio

e recordo
os risos em volta da escola
os joelhos esmurrados doridos
esse tom de infância
que nunca mais terei.

15 de Setembro de 2003





outonal #2

o lamento visível é
o corpo que não volta
a fazer-se tenro
como a promessa
de que há-de crescer

e nunca mais agora
poderei abraçar um plátano
com braços insuficientes
nem cair da bicicleta
para os silvados de amoras
ou sequer aquietar um pássaro
nas minhas mãos de criança

se não fui a tempo
de rir todos os risos
cair em todos os caminhos
sonhar todas as histórias
talvez agora encontre
uma sucessão de passos
semelhante à memória
das sombras na parede do quarto
dos casacos para enfrentar o vento
dos inesperados labirinos do medo

aguardo um Outono pacífico
um outro silêncio que não este
um poço de folhas para pousar
o corpo agora desmesurado
amedrontado e espectante.

22 de Setembro de 2003

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posted by saturnine | 15:44 | 0 comments

 

 

 

 

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